O sistema de geração
de energia elétrica do Brasil é de causar inveja a vários países
do mundo. Trata-se de uma matriz energética com ampla predominância
de fontes renováveis, mais baratas e menos poluentes. Atualmente, o
Brasil conta com 80 mil MW de capacidade hidrelétrica instalada,
sendo o segundo maior produtor de energia proveniente dessa fonte,
atrás apenas da China (197 mil MW).
Apesar de representarem
78% da capacidade instalada do parque gerador brasileiro, as
hidrelétricas foram responsáveis por 89% da energia gerada em 2011,
enquanto as termelétricas geraram apenas 6% no mesmo período,
quando sua participação na potência instalada é de 13%.
Além disso, é
importante ressaltar a vantagem do grande sistema interligado por
linhas de transmissão que permite explorar as complementaridades
hidrológicas entre as diferentes bacias hidrográficas com a
"transferência" de energia de uma região para outra.
As instituições do
setor devem
reafirmar o compromisso com a
modicidade tarifária e a
universalização
Essa é uma vantagem do
sistema hidrotérmico brasileiro, pois além da predominância
hidrelétrica, os reservatórios de acumulação existentes permitem
o aproveitamento dos excedentes hídricos, contribuindo para a
redução do consumo de combustíveis e, consequentemente, do custo
de geração de energia. Se não tivéssemos abandonado a construção
de usinas com reservatórios, a situação estaria mais tranquila,
pois poderíamos contar com mais água para gerar energia e dispensar
o acionamento de térmicas, mais caras e poluentes.
O que acontece é que
nos períodos de pouca chuva, como agora, esse excedente energético
deixa de existir e, para garantir o atendimento a todas as cargas, as
usinas térmicas são colocadas para operar na sua capacidade máxima.
Isso é normal, em função do ciclo das chuvas. Não adianta
acreditar que os benefícios das sobras de energia de origem
hidráulica sejam permanentes. Neste momento, a geração térmica
está no limite, produzindo 13,7 mil MW médios. O cenário que se
vislumbra com os níveis dos reservatórios muito baixos e sem chuva
é o de permanência dessa situação para os próximos meses. O
problema é que a geração térmica custa muito mais caro. Enquanto
a energia das hidrelétricas custa cerca de R$ 100 por MWh, o custo
da energia gerada por usinas térmicas que operam com combustíveis
fósseis, como óleo diesel, pode chegar a R$ 800 por MWh.
É claro que a
segurança do suprimento energético deve ser o principal objetivo do
governo e que energia mais cara é aquela que não existe. Contudo,
nas condições atuais de suprimento, o custo adicional da geração
aumentará sobremaneira, sendo os distribuidores de energia elétrica
os principais agentes que absorverão os impactos financeiros
imediatos desse incremento de despesa.
As distribuidoras pagam
esse custo adicional praticamente à vista e recebem dos consumidores
por ocasião dos reajustes (até 12 meses depois) em 12 prestações
diluídas na conta de luz, podendo gerar hiatos de até 24 meses
entre a despesa e a receita correspondente. A atual cobertura
tarifária dos distribuidores para esse custo adicional é da ordem
de R$ 150 milhões mensais
Contudo, em novembro de
2012 esse encargo total foi da ordem R$ 547 milhões. Em dezembro de
2012, o montante chegou ao incrível valor de R$ 900 milhões. Nos
meses subsequentes, mediante o cenário vislumbrado, esse valor
poderá alcançar a cifra de R$ 1 bilhão por mês. Por enquanto,
essa geração extra vai representar um aumento de 4,8% na conta de
luz, mas o valor pode ser maior. Tudo vai depender do período
chuvoso e do prolongamento do uso da geração térmica.
Essa condição é
agravada pelos efeitos do 3º ciclo de revisão tarifária das
distribuidoras de energia elétrica, que vêm ocasionando forte
redução na margem de contribuição econômica dessas
concessionárias. O incremento da despesa mensal para pagar a geração
térmica, conforme nossas estimativas, drenará, em média, mais de
50% do Ebitda mensal do setor de distribuição de energia elétrica.
Considerando que a
operação das usinas térmicas visa garantir o suprimento
energético, nossa preocupação imediata reside em uma exasperação
do risco de inadimplência setorial com consequente rompimento da
cadeia de pagamentos do setor - distribuição e geração.
O instrumento
contratual disponível seria a execução da cláusula de revisão
extraordinária dos distribuidores. Contudo, essa revisão que está
prevista para fevereiro de 2013 deve-se restringir apenas aos itens
associados à MP 579/2012, que trata da revisão das concessões do
setor elétrico. Nesse sentido, estamos buscando apoio junto ao
governo para garantir que o impacto tarifário seja o menor possível
e a perda no caixa das distribuidoras possa ser suportada sem drenar
recursos de outros objetivos importantes como os investimentos
necessários para garantir a confiabilidade durante os jogos da Copa
do Mundo de 2014. Temos que evitar também uma inadimplência
generalizada que comprometa a sustentabilidade do setor, como já
tivemos em outros momentos do passado e não foi agradável.
As instituições do
setor elétrico devem atuar, neste momento delicado, reafirmando o
compromisso com a modicidade tarifária e a universalização do
serviço, mas é preciso que a sustentabilidade financeira das
empresas seja preservada para que elas possam cumprir seu papel.
Energia é um insumo fundamental para o Brasil crescer com segurança
e receber investimentos estrangeiros. É hora de o governo,
associações, indústria e agentes do setor trabalharem juntos para
que se continue garantindo a segurança energética e o país não
fuja da rota de crescimento econômico.
Valor Econômico | Nelson Fonseca Leite
presidente
da Associação Brasileira de
Distribuidores
de Energia Elétrica (Abradee).
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