domingo, 8 de janeiro de 2012

Deus não fala pela boca de economistas

O "Estadão" primeiro e a Folha-papel em seguida recuperaram a tabelinha que Delfim Netto já havia publicado em sua coluna, para demonstrar que todos, repito TODOS, os palpites dos economistas sobre o desempenho da economia em 2011 foram furados.
Usei a tabelinha na coluna do dia 23, mas volto a ela por duas razões. Primeiro, porque ao menos um economista teve o bom senso de reconhecer que seu palpite não é a palavra de Deus: "Os erros são inevitáveis. A vida real é mais complexa do que os modelos matemáticos são capazes de prever", disse à Folha o economista-chefe da LCA, Bráulio Borges.
Editoria de Arte/Folhapress
AS PREVISÕES PARA 2011
AS PREVISÕES PARA 2011
Borges explicou ainda que a maioria das consultorias e bancos trabalha com mais de uma projeção, mas só divulga aquela em que veem maior probabilidade. "Nossa projeção principal é de que o Brasil vai crescer 3,1% em 2012. Vemos 65% de chance de isso acontecer", afirmou.
Muito bem, uma lufada de bom senso em um mundo, o dos economistas, que se acham, com raras exceções, professores de Deus. Pena que ele não acrescentou que as previsões da LCA serão acompanhadas do aviso de que só há 65% de chance de acertar. Não sei qual a chance de se fazer a previsão jogando búzios, mas talvez não seja muito menor.
O mais honesto, se os economistas não fossem ainda mais arrogantes que os jornalistas, seria usar o método do Boletim de Inflação e Análise Macroeconômica da Universidade Carlos 3.o de Madri, exposto em artigo para "El País" de Antoni Espasa, seu diretor.
O método parte do mesmo princípio exposto por Borges à Folha, ou seja, o de que não há 100% de chance de acertar. Então, Espasa usa o que ele chama de intervalo de confiança. No caso da economia espanhola, o Boletim estima um crescimento para 2012 de 0,1%, com um intervalo entre 1,3% e -1,1%. Mesmo com essa margem, segundo Espasa, a chance de acertar é de 80%.
Já as demais consultorias preferem cravar um único número, sem qualquer intervalo, o que torna as chances de dar certo iguais ou até inferiores ao do jogo de búzios. Que tal um pouco de humildade e honestidade intelectual?
Ah, e que tal o jornalismo doravante cobrar essa honestidade, cada vez que reproduzir uma previsão?

Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna às terças, quintas e domingos no caderno "Mundo". É autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo e "O Que é Jornalismo".

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