Sou concursado e atuo como
analista no setor público. O primeiro concurso para o órgão onde trabalho
ocorreu há menos de um ano. Os gestores do RH não divulgam o plano de carreira
dos funcionários e também nem acredito que o mesmo exista. O salário e os benefícios
oferecidos para todos os cargos estão abaixo dos demais concursos e a
rotatividade dos funcionários é de 50%. O posicionamento do RH quanto a isso é
apenas chamar o próximo da lista de aprovados. Além disso, eles deixaram claro
que o concurso foi direcionado para pessoas sem experiência, que aceitariam um
salário baixo e sem perspectiva de crescimento profissional. O diálogo e a
transparência do RH inexistem, o que vem gerando uma grande insatisfação entre
os funcionários. O que fazer diante disso? Devo apenas usar o emprego como algo
temporário, evitando estabelecer vínculos subjetivos até encontrar outra
instituição com a qual possa criar uma ligação com maior grau de reciprocidade?
Analista de investimentos, 28
anos
Resposta:
Sua carta revela mais
dificuldades e questões suas do que especificamente da administração pública.
Os concursos públicos são abertos quando há necessidade de profissionais
específicos para a realização de tarefas específicas. É claro que há o ideal de
planos de carreira para servidores, mas a enorme maioria das tarefas a serem
realizadas são relativamente estáveis no tempo.
São necessários milhares de
professores em sala de aula e milhares de médicos nos hospitais. Milhares de
enfermeiros e inspetores de disciplina, e daí por diante. Não é possível pensar
em progressão de carreira para todos esses profissionais no mesmo ritmo com que
se pensa a progressão em empresas em fase de expansão no mercado. O concurso se
dá quando é necessário repor esses quadros ou quando se abrem novas carreiras -
como os gestores públicos, recentes no país nas três esferas do executivo.
Há o ideal, na área pública, da
vocação. A estabilidade de carreiras e a tranquilidade para realizar a
atividade se dá em troca de um ritmo de carreira mais lento e salários menos
agressivos. Esse fato deveria ser levado em conta na hora de realizar um
concurso público.
A área de gestão de pessoas no
setor público não é, e não pode ser cobrada, como a típica da iniciativa
privada. Você afirma que lhes falta transparência, mas não é o que me parece.
Se o RH afirma que não há planos de cargos e salários, está sendo transparente.
Deram-lhe um dado de realidade com todas as letras. A questão é o que você fará
com essa informação.
Leve em conta que a liberdade do
gestor público para tomar decisões relativas a salários e benefícios é bem
menor que a do privado. O executivo na iniciativa privada pode fazer tudo
aquilo que a lei não proíbe, sob fortes pressões competitivas e com demandas
por ganhos crescentes. Nesse contexto, a pressão sobre as pessoas é maior e a
necessidade de pagar mais decorre das pressões de mercado, com forte disputa
pelos melhores talentos.
O executivo público deve fazer o
que a lei lhe obriga, com fortes restrições de recursos para atender às
demandas sociais em um país com muita pobreza e desigualdade e com a
necessidade de atuar em áreas onde só o Estado pode prender, fiscalizar,
julgar, legislar, dentre outros.
Quando você fez o concurso, sabia
da tarefa para a qual estava sendo contratado e o salário que receberia.
Participou do processo seletivo com posse dessas informações. Teoricamente,
você fez o concurso porque aceitou esse acordo. É necessário, como
profissional, saber o que está em jogo quando faz as suas escolhas: estabilidade,
baixa pressão competitiva e aposentadoria garantida não combinam com
remuneração agressiva, planos de cargos e salários com grandes possibilidades
de progressão na carreira e área de gestão de pessoas pensando em grandes
estratégias de retenção.
Quando pensamos em transparência,
essa é uma via de mão dupla. A alta rotatividade gera custos para o Estado.
Espera-se, de quem faz o concurso, que de fato aceite o acordo. Mas,
verificamos hoje a emergência do profissional de concursos: sem vocação definida,
faz um leilão da própria carreira para quem pagar mais. Deseja salários altos,
mas não quer se expor à briga de foice do mercado privado. Quando encontra um
teto de carreira, acusa à organização pelas restrições que lhes são impostas.
Sugiro que você reflita sobre as
suas escolhas de maneira mais profunda e veja se é possível, de fato, ter todos
os proveitos que você deseja em uma mesma organização. Tome decisões baseadas
nas escolhas relevantes que a realidade te coloca.
E-mail: diva.executivo@valor.com.br
Valor Econômico
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