O artigo tem mais de 25 anos. Foi
escrito no extinto Jornal da Bahia, em 1979, mas parece que foi redigido hoje. O autor é José Alberto Gueiros.
JORNAL DA
BAHIA - Sábado , 23 /09 /79
Quando Winston Churchill, ainda
jovem, acabou de pronunciar seu discurso de estréia na Câmara dos Comuns, foi
perguntar a um velho parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha achado do seu primeiro
desempenho naquela assembléia de vedetes políticas. O velho pôs a mão no ombro
de Churchill e disse, em tom paternal:
“Meu jovem, você cometeu um
grande erro. Foi muito brilhante neste seu primeiro discurso na Casa. Isso é
imperdoável. Devia ter começado um pouco mais na sombra. Devia ter gaguejado um
pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje, deve ter conquistado, no mínimo,
uns trinta inimigos. O talento assusta."
E ali estava uma das melhores
lições de abismo que um velho sábio pode dar ao pupilo que se inicia numa
carreira difícil. A maior parte das pessoas encasteladas em posições políticas
é medíocre e tem um indisfarçável medo da inteligência. Isso na Inglaterra.
Imaginem aqui no Brasil. Não é demais lembrar a famosa trova de Ruy Barbosa:
Há tantos burros mandando em
homens de inteligência que às vezes fico pensando que a burrice é uma Ciência.
Temos de admitir que, de um modo
geral, os medíocres são mais obstinados na conquista de posições. Sabem ocupar
os espaços vazios deixados pelos talentosos displicentes que não revelam o apetite
do poder. Mas é preciso considerar que esses medíocres ladinos oportunistas e
ambiciosos, têm o hábito de salvaguardar suas posições conquistadas com
verdadeiras muralhas de granito por onde talentosos não conseguem passar.
Em todas as áreas encontramos
dessas fortalezas estabelecidas, as panelinhas do arrivismo, inexpugnáveis às
legiões dos lúcidos.
Dentro desse raciocínio, que
poderia ser uma extensão do Elogio da Loucura de Erasmo de Roterdan, somos
forçados a admitir que uma pessoa precisa fingir de burra se quiser vencer na
vida. É pecado fazer sombra a alguém até numa conversa social. Assim como um
grupo de senhoras burguesas bem casadas boicota automaticamente a entrada de
uma jovem mulher bonita no seu círculo de convivência, por medo de perder seus
maridos,
também os encastelados medíocres
se fecham como ostras à simples aparição de um talentoso jovem que os possa
ameaçar.
Eles conhecem bem suas
limitações, sabem como lhes custa desempenhar tarefas que os mais dotados
realizam com uma perna nas costas, enfim, na medida em que admiram a facilidade
com que os mais lúcidos resolvem problemas, os medíocres os repudiam para se
defender. É um paradoxo angustiante.
Infelizmente temos de viver
segundo essas regras absurdas que transformam a inteligência numa espécie de
desvantagem perante a vida. Como é sábio o velho conselho de Nelson Rodrigues: finge-te
de idiota e terás o céu e a terra.
O problema é que os inteligentes gostam de
brilhar. Que Deus os proteja.
Nenhum comentário:
Postar um comentário