sábado, 19 de novembro de 2011

Prevenção é a melhor estratégia contra o câncer

Cientista diz como aumentar as defesas contra os tumores malignos


A Agência Internacional para Pesquisa em Câncer, ligada à Organização Mundial de Saúde, estimou que já em 2008 ocorreriam 12,4 milhões de casos novos de câncer, com 7,6 milhões de óbitos no mundo; principalmente pulmão, mama, cólon (parte do intestino) e reto. No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer estimou para 2010 (números válidos também para 2011) 489.270 casos novos de câncer, com destaque para pele do tipo não melanoma, próstata, pulmão, mama e colo do útero. Em entrevista durante o simpósio Cancer Research in the Media, em Guadalajara, no México, a oncologista Marcia Cruz-Correa, professora associada de Medicina e Bioquímica da Universidade de Porto Rico e professora visitante na Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, explica que a prevenção ainda é a melhor maneira de se proteger contra os tumores malignos.

O Globo - O que tem mais peso? Fatores ambientes ou genéticos no aparecimento de câncer?

MARCIA CRUZ-CORREA: O aumento da expectativa de vida é o principal fator de risco. Há algumas décadas, o câncer tinha baixa prevalência em países da América Latina e da Ásia porque as pessoas morriam antes de doenças infecciosas e outros males. Com o desenvolvimento de medicamentos, como as vacinas, essas populações passaram a viver mais. À medida que a expectativa de vida aumenta, as nossas células sofrem mais efeitos do ambiente, de toxinas e outros agentes, e apresentam mutações. Normalmente, as células do corpo são tão boas que têm a capacidade de se corrigirem, mas aos poucos, com o envelhecimento, perdem essa capacidade. Daí as recomendações de fazer alimentação saudável, incluindo vitaminas e minerais, e praticar atividade física regularmente.

O Globo - Qual é a relação entre obesidade e câncer?

MARCIA - Estudos indicam que pessoas com sobrepeso e excesso de peso têm risco aumentado de duas a seis vezes de desenvolverem câncer, principalmente de cólon, mama, próstata e estômago. Ainda não se sabe exatamente o motivo. Uma das hipóteses é que o excesso de peso causa inflamação crônica o que aumenta a chance de as células se danificarem e sofrerem mutações. Alguns pesquisadores também acreditam que a obesidade modifica a flora bacteriana, levando a alterações genéticas, interferindo na ação de hormônios como insulina e fatores de crescimento.

O Globo - Por que um mesmo tipo de câncer se comporta de forma diferente?

MARCIA - Cada pessoa tem seus próprios mecanismos de defesa, que são diferentes, para lutar com o tumor. A resposta imunológica a uma terapia pode ter relação com os genes de cada indivíduo. Esta é uma das áreas de estudo da farmacogenômica. Outro aspecto é o ambiente. O sistema de defesa de um paciente com câncer num ambiente inóspito tem mais dificuldade de enfrentar a doença. O fator psicológico também pesa. Pesquisas realizadas com roedores com o mesmo tipo de tumor e características genéticas semelhantes mostraram que os animais que foram colocados num ambiente de isolamento sofreram mais estresse e apresentaram uma evolução pior da doença. O estresse aumenta a ansiedede e libera mais hormônios como cortisol que, por sua vez, aumenta a inflamação. E isto, como já mencionei, é um fator de risco para câncer.
O Globo - Os tratamentos personalizados, como as vacinas terapêuticas contra câncer, são promissores?

MARCIA - O melhor é a prevenção. Um exemplo é a vacina contra o papiloma vírus humano (HPV, na sigla em inglês), já disponível (inclusive no Brasil) e que protege contra o câncer de colo de útero e pênis. A medicina personalizada contra o câncer tem sido cada vez mais estudada. Antes se pensava que o câncer era uma doença única, mas hoje se sabe que existem centenas de tumores. Mesmo o tumor maligno de mama tem subtipos. Assim os médicos podem tentar usar medicamentos que bloqueiam mecanismos específicos da doença. Por exemplo, no caso de câncer de mama não se indica um tratamento com um anticorpo contra estrógeno se a paciente não tem um tumor com receptor deste hormônio. Antes o tratamento do câncer de mama era igual para todas as mulheres. Algumas respondiam, outras não. Outro exemplo. No caso de câncer de cólon, se o tumor tiver a mutação KRAS o paciente não vai se beneficiar de um tratamento padrão com anticorpo para bloquear a doença. Acredito que as vacinas terapêuticas que estimulam o sistema imunológico contra o câncer possam funcionar, mas ainda é preciso fazer mais estudos, testar mais esses medicamentos. Quando o paciente já tem câncer, isso indica que seu sistema de defesa já está comprometido e foi incapaz de reconhecer células malignas e atacá-las. Então não se sabe com certeza se essas vacinas terapêuticas podem realmente ajudar. O ideal seria indicar essas vacinas antes de o câncer se manifestar. Por exemplo, pessoas com pólipos no cólon podem apresentar um maior risco de câncer nesse órgão. Porém o seu sistema imunológico ainda funciona. Nesses casos, a vacina anticâncer poderia ser mais eficaz, estimulando a defesa do corpo a reconhecer o câncer muito precocemente, criando anticorpos contra o tumor, antes mesmo que ele possa evoluir.

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