Por Martin Wolf
Viva! A crise da região do euro será solucionada no encontro de cúpula da União Europeia neste domingo. Foi o que indicaram os participantes da reunião de ministros das finanças do grupo das 20 principais economias emergentes e avançadas. Será que tais esperanças se confirmarão? Não. É concebível - embora improvável - que a região do euro encontre maneiras de administrar a atual emergência. É inconcebível que consiga curar a doença, em parte porque os países-membros estão em estado de negação sobre a natureza da enfermidade e, em parte, porque é uma condição crônica.
Viva! A crise da região do euro será solucionada no encontro de cúpula da União Europeia neste domingo. Foi o que indicaram os participantes da reunião de ministros das finanças do grupo das 20 principais economias emergentes e avançadas. Será que tais esperanças se confirmarão? Não. É concebível - embora improvável - que a região do euro encontre maneiras de administrar a atual emergência. É inconcebível que consiga curar a doença, em parte porque os países-membros estão em estado de negação sobre a natureza da enfermidade e, em parte, porque é uma condição crônica.
Compreensivelmente, observadores externos, aterrorizados com outro choque financeiro mundial, exercem pressão intensa sobre os países-membros da região do euro para que lidem com suas crises interligadas, de falta de solvência e liquidez bancária e soberana. Os ministros convocaram a região do euro a agir "decisivamente para restaurar a confiança, estabilidade financeira e crescimento".
Consertem os bancos; consertem a Grécia; e consertem os mercados de dívidas de outros países da região do euro mais enfraquecidos. Esses são os elementos do pacote desejado. A principal abordagem também é clara: despejar baldes de dinheiro por todos os lados.
Primeiro, o que deve ser feito quanto aos bancos? O ponto de partida é um teste de estresse confiável. É incerto, no entanto, o que seria um teste confiável. Isso depende das possíveis perdas com dívidas soberanas, algo não apenas desconhecido, mas condicionado a decisões políticas ainda a ser tomadas. A questão, então, é que taxas de capital próprio almejar. O sucesso será avaliado de acordo com a facilidade com que, subsequentemente, os bancos conseguirem se financiar. Esse é um exercício de psicologia de mercado, não de ciência.
Se, após os testes, os bancos tiverem de encolher os ativos, em vez de levantar capital, como agora ameaçam fazer, a cura poderia acabar se revelando pior do que a doença. A resposta é transformar essas taxas almejadas em níveis de capital que os bancos tenham de atingir. Os bancos vão berrar. Que o façam. Os Estados sustentam bancos. Os Estados têm o direito - e o dever - de assegurar que comportamentos em interesse próprio dos bancos sustentados por eles não provoquem depressões. A resposta é que se diga aos bancos para elevar as metas de taxas de capital, subscritas por Estados solventes ou pelo Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF, na sigla em inglês). Se não puderem levantar capital, que o dinheiro venha dos governos.
Segundo, o que deve ser feito quanto à Grécia? Como meu colega Chris Giles observou, o governo alemão acha que a dívida grega precisa ser reduzida a níveis sustentáveis, enquanto o governo francês, o Banco Central Europeu (BCE) e os bancos acreditam que a reestruturação precisa ser voluntária. Como é improvável que uma redução voluntária seja suficiente, isso não vai funcionar. A Alemanha está certa. O serviço das dívidas gregas precisa ser colocado em uma base sustentável. Qual, afinal, é o incentivo para os gregos reformarem seu governo e economia, se os benefícios para os credores aumentam indefinidamente? Quase nenhum.
Os tolos que emprestam dinheiro sem fazer perguntas merecem absorver parte das dores. Eles não deveriam esperar que os gregos os resgatem de suas tolices, depois de consumado o fato. A redução dos encargos com as dívidas pode ser alcançada com o corte do estoque de dívidas, redução dos juros ou prorrogação dos vencimentos. Com a dívida pública líquida prevista pelo FMI para 2012 sendo de 175% do Produto Interno Bruto (PIB) e sem a chance de captação nos mercados privados, os argumentos a favor de cortes radicais são fortes.
Terceiro, como proteger os outros países-membros vulneráveis? Uma onda de pânico autorrealizável nos mercados de dívidas soberanas de países grandes, como a Itália e Espanha, é o maior perigo com o qual as economias do região do euro e do mundo se deparam. Como o endividamento líquido da Espanha (previsto pelo FMI em 59% do PIB para 2012) e o déficit fiscal estrutural da Itália (previsto em 1,1% do PIB para 2012) são bastante baixos, ambos os países têm boas chances de reconquistar acesso aos mercados em condições mais favoráveis. A solução mais simples seria o Banco Central Europeu assegurar liquidez no mercado dessas dívidas públicas. Se isso for rejeitado ou considerado insuficiente, o EFSF poderia dar garantias parciais sobre as novas captações, como sugerido recentemente por Paul Achleitner, da Allianz.
Suponham que a crise imediata seja, de fato, superada dessa maneira. Será que isso seria promessa de um futuro ensolarado para o euro? Não. A resposta tampouco seria, como muitos sugerem, algum tipo de união fiscal. Certamente, se países-membros dignos de crédito transferissem recursos para membros sem crédito em escala grande o suficiente, a região do euro poderia sustentar-se. Mas, mesmo se tal política pudesse ser sustentada (o que é improvável), tornaria o sul da Europa um grande Mezzogiorno (como o sul da Itália costuma ser chamado). Isso seria um resultado calamitoso para a integração monetária europeia.
O desafio fundamental não é o financiamento, mas o ajuste. As autoridades da região há muito insistem que o balanço de pagamentos não dever ser de importância em uma união monetária. De fato, há uma crença quase religiosa de que o importante é o déficit fiscal: todos os outros balanços vão se equilibrar automaticamente. Isso é absurdo. O melhor previsor das dificuldades subsequentes foram os déficits externos pré-crise e não os déficits fiscais. Por que os déficits externos são importantes?
Primeiro, eles significam que os residentes gastam mais do que sua renda e financiam a diferença no exterior. Segundo, déficits externos prolongados também moldam a estrutura e competitividade de uma economia. Terceiro, déficits prolongados levam a imensos passivos externos líquidos, frequentemente, intermediados por bancos. Quando a concessão de empréstimos fica congelada, os bancos têm probabilidade de implodir, corroendo tanto a economia como a posição fiscal.
Mais importante que tudo, as pessoas se importam com o que acontece em seus países. Os habitantes de um país em depressão dificilmente se consolarão com a ideia de que os outros países-membros vivem em prosperidade.
Dentro da região do euro, o ajuste dos desequilíbrios continua essencial, embora seja imensamente difícil, porque a taxa de câmbio saiu de cena. Em vez do ajuste via cambial, há um ajuste via depressão e inadimplência. Uma união monetária com mercantilistas estruturais em seu núcleo agora ameaça provocar um declínio permanente em sua periferia. Resolver isso é a verdadeira cura. Será que pode ser feito? É o que me pergunto.
(Tradução Sabino Ahumada)
Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do FT
Nenhum comentário:
Postar um comentário