segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O "teto de vidro" precisa ser quebrado primeiro dentro de casa

Em uma edição recente do "Financial Times" havia uma fotografia na primeira página de Kate Middleton sorrindo com veneração para o futuro rei da Inglaterra e passando a nítida impressão de estar muito satisfeita com o seu novo emprego de mais importante esposa corporativa da nação.
A imagem divergia da mensagem que se espalhava pelo ar naquele dia sobre mulheres de negócios impetuosas. Chocava ainda mais com a revista encartada no jornal contendo o ranking do "FT" com as 50 executivas mais poderosas do mundo.
Quando me cansei de olhar para a mão da senhorita Middleton, rígida como se para exibir o anel de noivado de safira que pertencera à falecida futura sogra, resolvi dar uma olhada no artigo nas páginas internas do jornal. Era um relato de como as mulheres bem-sucedidas em suas carreiras estão ficando presas na "camada de marzipan" logo abaixo do conselho de administração. Segundo a autora do texto, Sylvia Hewlett da Universidade Columbia, isso está acontecendo porque pouquíssimos homens estão dispostos a puxar as mulheres para o topo do bolo. Os homens, afirma, não apoiam abertamente as mulheres porque acham que podem ser alvos de suspeitas de que estão tendo um caso com elas.
Isso me parece um motivo bem fraco para a falta de mulheres no cargo de executiva-chefe. A professora Hewlett está certa em afirmar que os homens impedem o progresso das mulheres, mas está errada em pensar que essa postura se dá no trabalho. Na verdade, ela acontece em casa. A principal razão de as mulheres alfa não se tornarem CEOs é que elas cometem o erro comum, e fatal, de se casarem com um macho alfa.
As evidências que tenho disso se baseiam em observações prolongadas de mulheres que conheço. Algumas delas se saíram de maneira brilhante por algum tempo, mas então suas carreiras estagnaram. O problema não foi que elas tiveram muitos filhos (mulheres bem-sucedidas parecem ter muitos), mas sim que seus maridos alfa insistiram em colocar suas carreiras em primeiro lugar.
Até pouco tempo isso era apenas um preconceito vago. Mas peguei a lista do "FT" das mulheres mais importantes do mundo dos negócios e entrei com os nomes de cada uma delas no Google, em busca de informações sobre suas vidas domésticas. De um modo irritante, algumas delas tiveram sucesso em manter suas vidas particulares longe dos holofotes, mas o restante me permitiu confirmar espetacularmente minha teoria. Quase todas têm filhos, mas não encontrei nenhuma com um marido alfa.
O único vestígio de um marido alfa veio da família de Andrea Jung, executiva-chefe da Avon, cujo marido era executivo-chefe da Bloomingdale's. Usei o tempo passado não porque ele perdeu o emprego, e sim porque ele perdeu sua esposa - o casamento se desfez. Até onde pude ver, todas as outras têm maridos que se prepararam para sacrificar suas carreiras e ajudar a ascensão gloriosa de suas esposas.
Indra Nooyi, executiva-chefe da Pepsi e executiva mais poderosa do mundo, é casada com um homem que desistiu de seu emprego e se tornou consultor para se encaixar na vida de sua esposa e dos filhos. O mesmo aconteceu com Irene Rosenfeld da Kraft, cujo marido decidiu trabalhar por conta própria há 20 anos para ajudá-la. Assim também foi com Ursula Burns da Xerox.
Há três razões bastante óbvias para o marido alfa ser um problema para a mulher que aspira ser CEO. O primeiro é a logística. Se você realmente quer ser bem-sucedida, precisa ter mobilidade e um marido como Gregg Ahrendts, que fechou sua construtora para que Angela pudesse se mudar para Londres e se tornar a executiva-chefe da Burberry. Você também precisa ter alguém que esteja preparado para cuidar ocasionalmente das crianças. E, acima de tudo, precisa de um pouco de encorajamento. Se você passa o dia todo competindo com os homens no trabalho, não vai querer ser competitiva em casa.
Você vai querer alguém como Lloyd Bean, o marido de Ursula Burns, que trabalhou na Xerox muito antes de sua entrada na companhia, mas que alegou ter ficado empolgado quando sua esposa o ultrapassou na corrida para o topo. Ou alguém como o marido de Chandra Kochhar, grande destaque do setor bancário indiano. Ela diz que ele está "genuinamente feliz com o meu progresso".
A lição para uma futura rainha corporativa é pensar muito bem na escolha do marido. Ela deve procurar alguém que mentalmente seja seu par, mas que fique feliz em ter um papel secundário. Em outras palavras, o homem certo deve ser uma Kate Middleton masculina. Aliás, há aqui um problema tanto na demanda quanto na oferta.
Mulheres ambiciosas são programadas para andar com homens ambiciosos. A maioria dos homens não sente atração por mulheres mais bem-sucedidas que eles. Enquanto isso não mudar, poucas mulheres continuarão saindo do pegajoso marzipan para chegar ao glorioso topo do bolo.

Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira
http://www.valoronline.com.br/impresso/eu-carreira/108/343569/o-teto-de-vidro-precisa-ser-quebrado-primeiro-dentro-de-casa

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